Se saíssemos
numa rua ou numa avenida qualquer movimentada de um grande centro urbano, como
a que existe em várias partes na cidade de São Paulo e perguntássemos para as
pessoas o que elas desejariam para 20 de novembro de 2020, com certeza, a
maioria não iria associar à data a comemoração do Dia da Consciência Negra.
Talvez desejassem ter mais dinheiro, obter uma promoção no trabalho, conquistar
o amor não correspondido. Outras mais atentas com os acontecimentos no Brasil
perceberiam a data e diriam que aproveitariam o dia de feriado para descansar,
relaxar. Por sua vez, outras iriam expor o seu desejo que em 2020 o feriado não
fosse mais facultativo, ou seja, tornasse nacional com a adesão, portanto, dos
5.564 municípios brasileiros. Infelizmente, acredito que ninguém teria a
consciência de avaliar corretamente a data e desejar, além dos seus anseios
individuais, algo coletivo, para o bem comum, como uma sociedade mais justa em
oportunidades econômicas, de educação, saúde, saneamento básico, cultura entre
outros, para todas as etnias que formam o Brasil, principalmente a negra, cujo
país tem uma dívida histórica por ter submetido os negros a uma vergonhosa
escravidão que durou penosos 388 anos (abril de 1500 até maio de 1888).
Apesar do fim
oficial da escravidão, ainda em pleno século XXI, acompanhamos pela imprensa e
pelos dados fornecidos pelos órgãos oficiais do governo como o IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística), que ela ainda existe. Muito menos
perceptível que outrora, escamoteada pelo falso discurso e ideia de que a
miscigenação brasileira é um sucesso, sendo até referência para o mundo,
acredito que os negros ainda não estão plenamente libertos. Há outra
escravidão em curso. É a escravidão da falta de oportunidades para os negros, alijados
de acessarem o que é de direito de todos os brasileiros, apesar de vivermos num
Estado livre e democrático.
A passagem da
condição de escravos para libertos, em maio de 1888, não melhorou o quadro
socioeconômico em que viviam os negros no Brasil. Mais de 100 anos após a
libertação, os negros são o grupo socioeconômico mais pobre do país. Os dados
demonstram que a situação de renda, educação, saúde e desemprego da população
negra no Brasil é aviltante e revela os preconceitos e a marginalização aos
quais ela está submetida, apesar de haver movimentos negros bastante atuantes,
que lutam pelo fim dessa situação.
A instituição
do Dia da Consciência Negra, criado por lei em janeiro de 2003, mas já adotado
pelo movimento negro desde a década de 1970, deveria ser um dia em que todos os
brasileiros não só descansassem os seus corpos e mentes da rotina diária, mas
sim, um dia de conscientização e reflexão sobre a igualdade racial no Brasil,
um país ainda manchado por diferenças e discriminações raciais.
Enquanto
anualmente o dia 20 de novembro passar por nossas vidas de forma
insignificante, sem merecer uma reflexão e dessa reflexão gerar uma ação para
mudar o status quo do negro no
Brasil, teremos que conviver, ainda, tristemente com manchetes estampadas nos
jornais que denunciam a violência e a falta de oportunidades e perspectivas que
o negro sofre no país.
O crescimento
econômico brasileiro, que o coloca como a sétima maior economia do mundo, não
tem se traduzido em melhorias na educação básica, imprescindível para que o
país obtenha no futuro uma geração que tenha as suas mentes descolonizadas do
preconceito e da intolerância racial e passem, a enxergar, o valor que a
miscigenação tem para toda a sociedade brasileira. O crescimento do país, não
somente na área econômica, depende dos esforços, da relação e da união entre
negros, mestiços e brancos.
Espero que em
20 de novembro de 2020, nós já possamos ter encontrado o ponto de união entre a
mestiçagem e a negritude para a formação de uma força capaz de mudar a história
do negro no Brasil. Que a partir dessa data, essa força, imbuída pela força de
Zumbi, que lutou até a morte pela cultura e pela liberdade do povo negro,
possa, brevemente, conseguir dar de vez a genuína liberdade para o povo negro.
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